sábado, 30 de dezembro de 2017




Recordar Cristina Torres dos Santos














 Fundação Mário Soares




Do blogue
"Com o final da Guerra, em 45, os oposicionistas acreditaram na possibilidade de uma mudança democrática para o país. Não anunciara Salazar a organização de eleições livres, «como na livre Inglaterra»?  Esta declaração levou à génese do Movimento de Unidade Democrática (MUD) após uma reunião no Centro Republicano Almirante Reis, a 8 de Outubro, e ao lançamento de listas de aderentes, que rapidamente se encheram de assinaturas, por todo o país. Pediam-se «eleições livres», sim, mas também um adiamento das mesmas que permitisse a reorganização adversária e a constituição de uma lista para concorrer às eleições. Mas Salazar não estava interessado, obviamente, e não as adiou. Pelo contrário, obrigou à entrega das listas e perseguiu todos os que as assinaram, tendo sido demitidos os funcionários públicos por traição ao célebre decreto de 1935 [2] que obrigava a fidelidade ideológica ao regime.
A partir do MUD constituiu-se a Comissão de Escritores, Jornalistas e Artistas Democráticos, (CEJAD), e foram esses artistas e homens de cultura  que levaram a efeito as dez EGAPs (Exposições Gerais de Artes Plásticas), realizadas entre 1946-1956, na Sociedade Nacional de Belas Artes (SNBA). Tarefa árdua que exigiu empenho e luta pela conquista desta instituição, dominada até então por direcções obsoletas e refractárias a tudo o que fosse novo.  A SNBA abria-se à modernidade, passando a constituir a Casa dos Artistas, de todos os artistas, conforme os objectivos da sua formação, em 1901.
As EGAPs excluíram os habituais júris de selecção. Todos os expositores eram bem-vindos. Novos e velhos. Antigos e modernos. Por isso se chamavam gerais. Por admitirem todos os géneros artísticos, independentemente dos conceitos estéticos de cada um. O objectivo era juntar a família artística numa frente que se opusesse aos salões oficiais estadonovistas.
«Não está em causa (…) o valor (…) das obras apresentadas. Aqui surgem nomes consagrados e nomes de estreantes, obras de certo fôlego e obras que não vão além dum simples esboço. A atenção deve antes voltar-se para as intenções da exposição, para a afirmação deste desejo de cooperação,  para esta necessidade de unidade que a Arte hoje exige em seu favor e aqui irmana artistas tão diferentes e tão afastados até agora.»[3]
Mário Dionísio virá a corroborar esta ideia central de unidade, em 1975: «À CEJAD [pertenceram] muitos artistas, de todas as idades e tendências estéticas e ideológicas. De um dia para o outro, esses artistas compreenderam que, por mais importantes que fossem as diferenças que os separavam, (…) algo de comum os unia. Que, além de impressionistas ou naturalistas, surrealistas ou neo-realistas, eram também anti-fascistas e que, sem prejuízo das suas posições próprias no campo da arte, (…) o seu lugar era ali, na grande frente enfim formada contra o inimigo (…) de nós todos.»[4]
Uma exigência se impunha como se um «pacto de honra» unisse a todos:
«a de não ter exposto nunca no SNI[5] ou de não voltar a lá expor a partir daquela data»[6]  
Aboliram-se também as tradicionais presenças do Presidente da República e seus acólitos, nas inaugurações. As portas da SNBA abriram-se, simplesmente, a todos que quisessem fruir das obras de arte e dos seus autores. Os objectivos eram claros e vinham consignados desde o primeiro certame, reafirmados no catálogo do segundo:
«aproximar a arte do povo. (…) trazer ao povo as várias linguagens das artes plásticas, lado a lado, para que ele aprecie e lhes descubra as mútuas relações; trazer ao povo uma mensagem de amizade e solidariedade».[7]
A primeira EGAP, em Julho de 46,  juntou 93 artistas e teve inusitada afluência de público. A segunda, em Maio de 1947, reuniu um número maior de expositores e de obras, mas, então, já o clima social estava ao rubro. Particularmente agitado, o ano de 47 foi palco de acesas lutas políticas, nas escolas e fora delas, por parte dos jovens do MUD juvenil [8], fortemente implantado entre os estudantes. Proibida a Semana da Juventude, que haviam programado para Março desse ano, todas as iniciativas culturais dos jovens mudistas viriam a ser impedidas, muitas delas por intervenção policial violenta. As prisões sucederam-se e, a pouco e pouco, todos os dirigentes daquele movimento juvenil foram parar ao  Aljube e a Caxias[9].
Ao MUD e ao MUD Juvenil, e, por conseguinte, à CEJAD (Comissão de Escritores, Jornalistas e Artistas Democráticos), pertenciam os artistas reunidos nas EGAP’s. Muitos deles já haviam passado pelos calabouços da polícia política e outros estavam presos, como Júlio Pomar. Apesar das conjunturas política, cultural e social serem dificílimas,  apesar das perseguições e das cisões que foram ocorrendo, a verdade é que cada ano chegavam novos artistas militantes e, as Gerais, puderam realizar-se até meados da década seguinte, podendo afirmar-se que foi nelas que o Neo-Realismo se afirmou nas artes plásticas. Muitos nomes consagrados ali expuseram pela primeira vez. E novas abordagens estéticas e artísticas também ali foram iniciadas[10]. Era uma forma de Luta e de Resistência e, sem dúvidas, aquele foi, reconhecidamente, o «Salão da Oposição», entre 46-56."












Cristina Torres dos Santos




















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